"E senti na garganta o nó górdio de todos os amores que puderam ter sido
e que não foram."
Gabriel Garcia Marquez
Depois de uma fornada suculenta de pães
de queijo, sentamo-nos e os raios catódicos vindos da TV nos arrastaram as
retinas para receber o impacto. No noticiário, a fatídica notícia, a morte
anunciada, Gabo se foi. Dilacerados! Difícil aceitar a partida do mestre que já
punha as botas em direção à Divina Providência. Foram, literalmente, cem anos
de solidão ali, no sofá.
Com um pouco de delírio do verbo,
agora, tentamos esmiuçar essas pequenas palavras de agradecimento. Precisávamos
produzir algo pra externalizar todos os fluxos que por nós passaram e nos
deixaram atônitos, desenfreados, caóticos, cheios de invasões oníricas durante
a noite. O amor nos tempos do cólera.
Eu, Moisés, particularmente, me tornei
um alvoroço ambulante dadas as repercussões dos escritos de Gabriel no roteiro
de my vida. Uma paixão instantânea me tomou por completo ao ler O amor nos
tempos do cólera. Durante duas semanas, estive absorto pelo conclave cósmico
daquele livro, me apaixonei, odiei, chorei e em uma instância mais profunda,
tomei todos os sintomas fisiológicos de um apaixonado: mil palpitações, mil
projeções, um completo bobão jogado à sarjeta da paixão. Ao fim da leitura um
alívio, claro aqui está, não pelo enredo, mas pelos sintomas que já me
consumiram.
Apaixonado por sua escrita dinâmica/pavorosa/ardente/mágica, dei
início à incessante leitura de sua bibliografia. Como dizem, nunca se é bom
começar a conhecer um escritor pela sua leitura mais prodigiosa e aclamada, é bom comer pelas beiradas, ir comendo a massa e
deixar o recheio pra depois. Mas, na sequência, tomei a leitura de Cem anos de
solidão. Ah! Oh, céus! Outro esquizosentimento, só que dessa vez, uma
identificação ancestral era o que descrevia a postura diante do livro, era como
se Garcia trouxesse a mim o relato dos antepassados, a lamúria dos anos
transcorridos na América e dados ao esquecimento, remédio paliativo da nossa trajetória sanguinária e horrenda,
não obstante bela e magnífica. Qual perspectiva você prefere? Eu fiquei com a
totalitária.
A cada página, um vislumbramento maciço de um raciocínio peculiar
e uma imaginação fascinante outrora taxada como imprópria ou até mesmo
exotérica, mas isso sempre me chamou atenção. Gabo me conheceu, assim como
tantos outros leitores. Escreveu pra nós! Terminei Cem anos num delírio
assustador, detectar a estirpe, minha estirpe, nossa estirpe, o que me fez
recorrer a esforços e a uma racionalização da nossa condição político-social
que, associada a um realismo mágico, me transformaram noutro. Fui José Arcádio,
fui Aureliano, fui Úrsula, fui Petra Cotes, fui Rebeca, fui Pietro Crespi, fui
Amaranta, fui Remédios, fui coronéis e soldados, dona-de-casa, sonhador, vendi
peixinhos de ouro e água em pedra, comi terra, fiz emplastros, até um rabo de
porco tive. Me atrelei às concubinas; do álcool, fiz remédio, delirei embaixo
da castanheira, entreguei minha alma a Melquíades.
A partir do término de tal leitura, me
interessei incessantemente por sua história e mais ainda fã fiquei ao perceber
a resiliência de Gabo, um verdadeiro ídolo, um pai de nações. Aqui ficam meus
sinceros agradecimentos pelo tempo desprendido a nós e por toda essa rica
produção que nos faz delirar a lucidez orgânica dos dias.
@elapsed_
@lollaine
@lollaine
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